À primeira vista, o bolsonarismo venceu nos últimos dias. Conseguiu o que poucas semanas atrás parecia impossível: aprovou com folga a urgência de um projeto que anistia Jair Bolsonaro e seus aliados envolvidos no 8 de janeiro e na trama golpista.

Encurtou-se assim o caminho para levar a voto a maior bandeira do bolsonarismo. Seria ótimo para Jair Bolsonaro se fosse verdade. Mas não foi isso que aconteceu nos últimos dias.

O que se viu nas últimas 24 horas na Câmara dos Deputados tem muito mais a ver com jogo político do que com atividade legislativa. O texto cuja urgência foi aprovada ontem nem sequer é aquele que irá a votação.

É só uma espécie de tapa-buraco, um pedaço de papel a ser substituído com uma nova proposta, diferente daquela sonhada pelos aliados fiéis ao ex-presidente.

Quem dá as cartas, neste momento, não é Jair Bolsonaro. Mas sim o bom e velho Centrão, aquele grupo de partidos que compreendeu muito tempo atrás que mais vale manter um pé em cada canoa.

Em poucos dias, o grupo conseguiu duas proezas: usou a anistia como moeda de troca para aprovar uma agenda que lhe é muito mais cara: a PEC da Blindagem. E agora coloca o perdão a Bolsonaro no centro de uma agenda que até joga contra o ex-presidente.

Parece confuso, mas não é: a anistia que o Centrão fala em aprovar é uma mudança na legislação para alterar as penas impostas a alguns crimes, como abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado.

Sim, Bolsonaro pode ser beneficiado. Em tese, as negociações passariam inclusive pela possibilidade de ele permanecer em prisão domiciliar, sem jamais precisar pisar na Papuda ou numa cela especial na PF. Pode ser. Mas, ao que tudo indica, Bolsonaro ficará mesmo fora do jogo eleitoral do ano que vem.

Assim, se fará absolutamente necessária a construção de um novo projeto para a corrida ao Planalto. Projeto este que, naturalmente, herdará o capital político de Jair Bolsonaro.

Talvez com um nome trazido para a política pelo próprio ex-presidente. Por que não Tarcísio de Freitas? Afinal, ele é filiado a um dos partidos do Centrão – o Republicanos – e incorporou ao seu governo em São Paulo as principais legendas que fazem parte desse grupo.

Na prática, os primeiros passos dessa anistia que toma forma no Congresso avançam na direção de uma composição que engloba a direita, o centro e até setores da esquerda.

Não é a anistia sonhada por Bolsonaro. Ele pode até sair desse processo com uma pena mais branda. Mas também pode ver seu poder político se diluir nas mãos das mesmas legendas que agora tomam a dianteira desse processo.

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